TEMA 2: INTOXICAÇÕES - ANIMAIS
PEÇONHENTOS
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Animais
peçonhentos são reconhecidos como aqueles que produzem ou modificam algum
veneno e possuem algum aparato para injetá-lo na sua presa ou predador. Os
principais animais peçonhentos que causam acidentes no Brasil são algumas
espécies de serpentes, de escorpiões, de aranhas, de lepidópteros (mariposas e
suas larvas), de himenópteros (abelhas, formigas e vespas), de coleópteros
(besouros), de quilópodes (lacraias), de peixes, de cnidários (águas-vivas e
caravelas), entre outros. Os animais peçonhentos de interesse em saúde pública
podem ser definidos como aqueles que causam acidentes classificados pelos médicos
como moderados ou graves.
Os acidentes por animais peçonhentos e, em particular, os acidentes ofídicos foram incluídos pela Organização Mundial da Saúde na lista das doenças tropicais negligenciadas que acometem, na maioria dos casos, populações pobres que vivem em áreas rurais.
ACIDENTES OFÍDICOS
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Picadas
de serpentes são comuns em sítios e fazendas, mas também podem ocorrer nas
grandes cidades. No Brasil, existem 70 tipos de serpentes venenosas, mas apenas
algumas têm importância no caso de acidentes ofídicos. São elas: a cascavel, a
jararaca, a surucucu e a cobra coral.
A
maioria dos acidentes é relatada durante o verão e a primavera, provavelmente
porque as baixas temperaturas das outras estações do ano reduzem o metabolismo
das serpentes e, consequentemente, a atividade das mesmas.
Os cães
e gatos domésticos são mais acometidos na região do focinho e pescoço, na
maioria dos casos, ao passo que bovinos e equinos são mais atingidos nos
membros (anteriores e posteriores) e abdômen.
Animal se recusa apoiar membro anterior direito após acidente
botrópico
http://rehagro.com.br/plus/modulos/noticias/ler.php?cdnoticia=2203
Nos gatos domésticos foi relatado que o número
de picadas de serpentes é pequeno em decorrência da agilidade desses animais.
Em bovinos, o número de mortos por picada de serpentes é bastante considerável,
estando na maioria das vezes, relacionados à picada de cascavel.
Gato picado por serpente
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O veneno é produzido pelas glândulas de veneno supralabiais, presentes nos dois lados da cabeça, ao longo dos maxilares. A constituição dos venenos é bastante complexa, contendo toxinas com diversas atividades. Algumas ações que os venenos podem ter são:
• ação proteolítica:
presente nos venenos botrópico e laquético; promove a desnaturação de
proteínas, resultando em necrose no local da picada:
• ação coagulante e anticoagulante: presente nos venenos botrópico, crotálico e laquético; há ativação da cascata de coagulação, gerando consumo do fibrinogênio circulante e formação de fibrina intravascular; há inativação de fatores da coagulação, como o fator XIII (*) e o fator de von Willebrand (**); há hipoagragação plaquetária e trombocitopenia;
(*)
fator XIII – a
tromboplastina, também conhecida como fator tissular ou fator III, é uma substância presente nos tecidos e no interior das
plaquetas (gragmentos celulares), cuja função é transformar a protrombina em
trombina na presença de íons Ca++, tendo um papel fundamental no processo de
coagulação.
(**) fator
de von Willebrand – é uma proteína polimérica sintetizada pelas células
endoteliais e megacariócitos; serve como transportador do fator VIII sanguíneo
e tem importante papel na coagulação do sangue.
• ação hemorrágica (enzimas metaloproteinases): presente nos venenos botrópico e laquético; atua de forma combinada com a ação coagulante e incoagulante, resultando em hemorragias locais e sistêmicas; rompe a integridade do endotélio vascular e tem atividade de desintegrina;
• ação neurotóxica: presente nos venenos crotálico e elapídico; é causada pelo bloqueio da placa neuromuscular;
• ação miotóxica: presente no veneno crotálico; promove lise e necrose das fibras musculares;
• ação nefrotóxica: presente nos venenos crotálico e botrópico; promove lesões tubulares e no endotélio dos vasos, que podem culminar em insuficiência renal aguda.
A gravidade do quadro vai depender da espécie da serpente, volume de veneno inoculado, espécie e tamanho do animal acidentado, tempo decorrido entre o acidente e o tratamento adequado, e local da picada.
O soro antiofídico continua sendo o único
tratamento específico utilizado em humanos e animais acidentados.
O soro é produzido em equinos, que são
imunizados pela administração de diversas doses do veneno. Quando a
concentração de anticorpos antiveneno circulantes estiver em níveis desejados,
são realizadas coletas de sangue para obtenção do soro que, posteriormente,
será concentrado.
A soroterapia deve ser feita com o soro
específico para o gênero da serpente responsável pelo acidente, pois não há
proteção cruzada entre os grupos de serpentes. Pode provocar reações de
hipersensibilidade, independentemente de sensibilização prévia. Os sinais
clínicos mais frequentemente observados nas fases iniciais destas reações são
urticária, prurido, tremores musculares, dispneia, tosse e náuseas. Os sinais
avançados incluem taquicardia, edema dos órgãos, coagulação intravascular
disseminada, hipotermia e falência múltipla dos órgãos.
A fim de evitar a reação de hipersensibilidade,
pode ser feita a prova intradérmica para determinar a sensibilidade do
paciente, mas este procedimento pode resultar em atraso no tratamento
específico.
Acidente
botrópico –
Jararaca
http://www.crmvmg.org.br/cadernotecnico/75.pdf
É causado por serpentes do grupo das jararacas. Correponde a aproximadamente 80 a 90% dos acidentes causados por serpentes peçonhentas. O veneno tem ação proteolítica e necrosante. Aumenta o tempo de coagulação ou incoagulabilidade; o paciente muitas vezes morre devido a uma hemorragia intensa. Tem ação vasculotóxica, ou seja, o veneno provoca ruptura dos vasos. É comum observar petéquias hemorrágicas em região abdominal. Tem ação nefrotóxica, causando uma insuficiência renal aguda no paciente.
Todas as espécies de animais domésticos são afetadas pelo veneno botrópico. Os mais sensíveis ao veneno botrópico são os equinos, seguidos pelos ovinos, bovinos, caprinos, caninos, suínos e felinos.
Sinais clínicos: provoca dor e inchaço no local da picada. Em alguns casos pode gerar manchas arroxeadas e sangramento pelos orifícios da picada, além de sangramentos em gengivas, pele e urina. Após 6 a 12 horas da picada, são evidenciadas equimoses, bolhas e necrose. Outros sinais:
- Apatia / prostração
- Taquipneia
- Claudicação
- Exsudação serosanguinolenta - sai sangue na pele íntegra do animal
- Sangramento sistêmico - hemorragia muito intensa
Cão picado no focinho por Bothrops apresentando edema
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Diagnóstico: feito pela presença de serpentes no ambiente, ocorrência de acidentes anteriores, manifestações clínicas, com destaque para o edema no local da picada. Frequentemente não ocorre a visualização do ataque, o que pode dificultar o diagnóstico. A confirmação é feita pela resposta à soroterapia antibotrópica.
Tratamento: o específico é feito com o soro antibotrópico ou antibotrópico-crotálico (antiofídico). A fluidoterapia deve ser instituída com solução fisiológica ou de Ringer, enquanto o animal não puder ingerir água. As infecções secundárias devem ser tratadas com antimicrobianos de amplo espectro. Administrar analgésicos e diuréticos (estes para aumentar a taxa de eliminação do veneno).
Acidente
laquético –
Lachesis - Surucucu
http://www.crmvmg.org.br/cadernotecnico/75.pdf
É causado por surucucu. Corresponde a 3% dos acidentes causados por serpentes peçonhentas. Este tipo de acidente apresenta quadro similar ao acidente botrópico. O veneno laquético apresenta atividades fisiopatológicas semelhantes às do veneno botrópico. Possui atividades coagulante, hemorrágica, inflamatória e necrosante (proteolítica).
Sinais clínicos: dor e edema no local da picada, sangramento nasal e gengival, vômitos, diarreia, bradicardia e queda da pressão arterial.
Diagnóstico: feito pela presença de serpentes no ambiente, ocorrência de acidentes anteriores e manifestações clínicas. A confirmação é feita pela resposta à soroterapia antilaquética.
Tratamento: antes de se iniciar o tratamento específico, deve-se avaliar a gravidade de acordo com os sinais locais e a intensidade das manifestações vagais (bradicardia, hipotensão e diarreia). O tratamento deve ser feito com soro antilaquético (SAL) e soro antibotrópico-antilaquético (SABL). O tratamento suporte pode ser feito com:
- Fluidoterapia
- Analgésicos opióides
- Limpeza da ferida
- Antibioticoterapia
- Anti-inflamatório
- Transfusão de plasma
- Sinais graves de parassimpático – fazer
atropinização
Acidente crotálico –
Crotalus – Cascavel
http://gcn.net.br/noticias/294177/criancas/2015/08/cascavel
A causado por cascavel. Corresponde a aproximadamente 10 a 20% dos acidentes causados por serpentes peçonhentas. Afeta o SNC (sistema nervoso central), causando ataxia e convulsão nos pacientes. Normalmente, no local da picada ocorre necrose. Ocorre agregação plaquetária, diminuindo o número de plaquetas circulates, podendo ocorrer hemorragias. O veneno da cascavel atua nos receptores de acetilcolina (Ach), e fica estimulando esse receptor; o animal apresenta contração muscular semelhante à cinomose. Após a picada, dentro de 5 a 10 minutos já começam os sinais clínicos.
As espécies animais mais sensíveis são bovina, equina e ovina, e a sensibilidade em sequência decrescente é caprina, canina, leporina, suína e felina.
Sinais clínicos: neste acidente, o local da picada não tem sinal evidente de lesão e a vítima tem sensação de formigamento. O acidentado tem dificuldade em manter os olhos abertos e possui dores musculares generalizadas. Além desses sintomas, podem apresentar:
- Edema e dor local
- Ataxia, fasciculações (mioclonia),
apatia, decúbito (não consegue se manter em estação). Sedação, flacidez da
musculatura da face, ptose palpebral (e prolapso de terceira pálpebra),
ptose mandibular
- Midríase
- Disfagia
- Dificuldade de fonação
- Sialorreia - não é tão intensa
- Vômito e diarreia
- Mioglobinúria - presença de
mioglobina na urina
- Proteinúria
- Sangue oculto
- Hipotensão
- Lesões renais secundárias - devido à
proteinúria, hipotensão e a mioglobinúria
Em bovinos. os sinais clínicos observados são inquietação e desconforto, seguidos por apatia, letargia, edemaciação discreta no local da picada, tremores musculares, incoordenação motora, decúbito, movimentos de pedalagem e paralisia flácida. Na fase avançada do envenenamento, há dispneia, sialorreia e paralisia do globo ocular.
Cavalo picado por serpente
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Em equinos, incluem aumento de volume no local de inoculação do veneno, apatia e cabeça baixa, miclonias (movimentos de pedalar), dificuldade de movimentação com arrastar das pinças no solo, decúbito e dificuldade para levantar, redução da sensibilidade cutânea, redução dos reflexos auricular, palatal do lábio superior e de ameaça, aumento das frequências cardíaca e respiratória e redução na temperatura retal.
A gravidade do acidente em animais domésticos pode ser classificada como leve, moderada ou grave (Tabela 1).
Manifestações clínicas
|
Gravidade do envenenamento
|
Leve
|
Moderada
|
Grave
|
Fácies miastênicas
|
Ausentes ou tardias
|
Discretas ou evidentes
|
Evidentes
|
Mialgia
|
Ausente ou discreta
|
Discreta
|
Intensa
|
Mioglobinúria
|
Ausente
|
Ausente ou pouco evidente
|
Presente
|
Oligúria ou anúria
|
Ausente
|
Ausente ou presente
|
Presente
|
Tempo de coagulação
|
Normal ou aumentado
|
Normal ou aumentado
|
Aumentado ou incoagulável
|
Tabela 1. Classificação clínica da gravidade do acidente
crotálico
http://www.crmvmg.org.br/cadernotecnico/75.pdf
Diagnóstico: é feito pela presença de serpentes no ambiente, ocorrência de acidentes anteriores e manifestações clínicas. A confirmação do diagnóstico pode ser realizada pela detecção do veneno circulante por meio de teste ELISA.
Tratamento: o específico é feito com o soro anticrotálico ou antibotrópico-crotálico (antiofídico), administrado por via IV. Diversas medidas de suporte deverão ser empregadas. A sondagem vesical é indicada para evitar a retenção urinária em decorrência da atonia vesical. É importante a fluidoterapia (solução fisiológica ou de Ringer), associada à administração de diuréticos para induzir a diurese.
Acidente elapídico –
Micrurus – Coral Verdadeira
http://www.aprenda.bio.br/portal/?p=5260
É causado por coral verdadeira. Corresponde a 1% dos acidentes causados por serpentes peçonhentas. Neste tipo de acidente não é
possível notar alteração importante no local da picada. O veneno possui ação neurotóxica de efeito rápido,
começa a fazer efeito depois de 3 minutos após a picada. Age na junção
pré-sináptica bloqueando a liberação de acetilcolina, o paciente fica com
paralisia flácida, o animal não tem contração muscular.
O veneno é muito potente
e pode matar em minutos. Os sintomas do envenenamento são neurológicos, como
dificuldade de abrir os olhos, falta de ar, dificuldade em engolir,
insuficiência respiratória aguda.
Sinais clínicos:
- Parestesia - o animal não tem
movimento
- Vômito
- Face miastênica
- Diplopia - visão dupla
- Dificuldade para deglutição - porque
não tem contração muscular
- Insuficiência respiratória aguda - por
causa da falta de contração muscular, o animal não consegue movimentar a
musculatura intercostal e nem o diafragma
Diagnóstico: é feito pela presença de serpentes no ambiente, ocorrência de acidentes anteriores e manifestações clínicas. A confirmação do diagnóstico é feita pela resposta à soroterapia antielapídica. O diagnóstico diferencial entre o acidente crotálico e o elapídico é feito pela avaliação e comprometimento de órgãos sistêmicos.
Tratamento: soro antielapídico. Não há
tratamento complementar; no caso deste tipo de acidente, internar imediatamente
o animal.
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É importante ter em mente que podemos evitar as
serpentes se entendermos os hábitos desses animais. As serpentes entram nas
propriedades em busca de alimento, que pode ser ovos de patos ou galinhas,
pintinhos e pequenos roedores. Se deixarmos lixo em nossa propriedade, ele
atrairá os ratos e, portanto, as serpentes.
Você pode consultar os pontos
para atendimento dos acidentes de animais peçonhentos no site www.cve.saude.sp.gov.br.
No Institito Butantan o atendimento especializado gratuito é ralizado 24 horaspelo Hospital Vital Brazil, inclusive com atendimento telefônico.
Hospital Vital Brazil
Avenida Vital Brazil, 1500 – Butantã
Telefones: (11) 2627-9529 e 2627-9528
Fax: (11) 3726-7962
CEP: 05503-900 – São Paulo/SP
Para saber mais –
http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/o-ministerio/principal/secretarias/svs/acidentes-por-animais-peconhentos
http://www.crmvmg.org.br/cadernotecnico/75.pdf
http://www.resumaodeveterinaria.com.br/intoxicacao-por-animais-peconhentos/
http://www.institutobutanta.com.br/como-tratar-picadas-de-animais-peconhentos/
http://www.webanimal.com.br/cao/acidente_ofidico.htm
http://www.infoescola.com/sangue/tromboplastina/
http://www.medicinageriatrica.com.br/2011/08/22/adesao-das-plaquetas-fator-de-von-willebrand/
http://rehagro.com.br/plus/modulos/noticias/ler.php?cdnoticia=2203